jats4r Conversion Vendor guri 1.0.0 5596 QUID 16. Revista del Área de Estudios Urbanos QUID 16 2250-4060 Área de Estudios Urbanos Argentina quid16@sociales.uba.ar Universidad de Buenos Aires, Facultad de Ciencias Sociales, Instituto de Investigaciones Gino Germani 10.62174/quid16.i21_a408 Espacio Abierto O “valor” e os estudos urbanos sob domínio das finanças Reflexões sobre o Time Value Money (TVM) à luz da crítica da economia política ‘Value’ and urban studies under the domain of finance Reflections on Time Value Money (TVM) based on the critique of political economy 0000-0002-2807-6117 Fernandes Borges de Oliveira Isadora isadoraborges@usp.br Conceptualización Curación de datos Análisis formal Adquisición de Financiamiento Investigación Metodología Administración de proyecto Recursos Software Supervisión Validación Visualización Redacción - preparación del borrador original Redacción - revisión y edición Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) https://ror.org/02ddkpn78 , Brasil

Este artigo consiste em uma versão aprofundada e aperfeiçoada de um trabalho final apresentado na disciplina “O valor das cidades: produção, circulação e apropriação no ambiente construído”, ministrada pela profa. Dra. Lúcia Shimbo, no Instituto de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (IAU-USP).

Enero-Junio 2024 21 a408 27 3 2022 13 9 2022 https://creativecommons.org/licenses/by-nc/4.0/ Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Atribución-NoComercial 4.0 Internacional. Resumo

Nas últimas décadas, algumas transformações no desenvolvimento do capitalismo mundial foram descritas a partir do fenômeno da financeirização, e diversos trabalhos avançaram nas aproximações entre as finanças e a produção do espaço urbano. Seu uso generalizado, contudo, suscitou críticas que argumentavam ser necessário “abrir a caixa preta das finanças”, reivindicando aprofundar os conhecimentos em relação ao que seria de fato essa financeirização e como ela se constitui, buscando entender sua materialidade, e seus imbricamentos no cotidiano. Nesse contexto, alguns estudos urbanos desenvolveram pesquisas associadas à sociologia construtivista, que partem de uma abordagem social do valor, entendido enquanto uma construção inequivocamente flexível. Essa literatura tem se dedicado a compreender os instrumentos e mecanismos utilizados pela engenharia financeira, que se apoia na ideia de que o dinheiro admite um valor no tempo (em inglês, Time Value Money, ou TVM), com o argumento de que essas práticas “calculativas” projetam o futuro, traduzindo-o em transformações materiais que produzem o próprio futuro, sendo, portanto, performativas. Por meio de uma revisão bibliográfica, o objetivo do artigo é discutir esses trabalhos, refletindo sobre suas contribuições à luz da crítica da economia política, buscando compreender o papel da engenharia financeira a partir da teoria do valor. A hipótese aqui discutida é a de que, ao compreender essa engenharia financeira, suas métricas e práticas como atividades que, em vez de criarem valor, impulsionam a elevação dos preços imobiliários –quando combina os cálculos da produção industrial tradicional (a construção) aos cálculos de rentabilidade futura (capitalização)–, é possível situar essas contribuições no movimento do capital, e em seus imbricamentos com as relações entre valor e preço.

Abstract

In recent decades, some changes in the development of world capitalism have been described according to the phenomenon of financialization and several works have advanced in the approach between finance and the production of urban space. However, its widespread use led to criticisms arguing the need to “open the black box of finance”, claiming to deepen knowledge with regards to what this financialization would be and how it is constituted, seeking to understand its materiality and its imbrications in everyday life. In this context, part of urban studies developed research associated with constructivist sociology, which starts from a social approach to value, understood as an unequivocally flexible construction. This literature has been dedicated to understanding the instruments and mechanisms used by financial engineering, which is based on the idea that money has a time value (Time Value of Money - TVM), arguing that these “calculating” practices that project the future are translated into present material transformations, producing their own future and being, therefore, performative. Based on a bibliographic review, this study aimed to discuss these works, reflecting on their contributions based on critical political economy, seeking to understand the role of financial engineering from the theory of value. The hypothesis discussed here is that, by understanding this financial engineering, its metrics and practices as activities that, instead of creating value, drive the increased real estate prices –by combining the calculations of traditional industrial production (construction) with the calculations of future profitability (capitalization)–, it is possible to situate these contributions to the movement of capital and their imbrications with the relationships between value and price.

Palavras chave Financeirização Valor do dinheiro no tempo Produção do espaço Incorporação Habitação Keywords Financialization Time value of money Production of space Real estate developers Housing. A pesquisa foi viabilizada com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) – Processo nº 2020/15267-6.
Introdução

Nas últimas décadas, transformações no desenvolvimento do capitalismo mundial foram descritas a partir do fenômeno da financeirização. Autores de diversos campos do conhecimento e com perspectivas nem sempre convergentes se dedicaram ao tema, identificando alterações profundas nos sistemas político e econômico, indicando um domínio significativo do sistema financeiro diante da tradicional economia industrial (Chesnais, 2015; Lapavitsas, 2013; Paulani, 2012; Vander Zwan, 2014).

No campo dos estudos urbanos, muitos pesquisadores passaram a discutir as aproximações entre as finanças e a produção do espaço, seja em países centrais (Aalbers, 2008), seja nos periféricos, como as nações latino-americanas (Klink e Souza, 2017; Socoloff, 2020). No Brasil, a bibliografia discutiu essas aproximações observando as mudanças da política habitacional e as formas de financiamento (Rolnik, 2015; Royer, 2009), as transformações estruturais dos agentes da produção imobiliária e das formas de produção e propriedade da habitação (Fix, 2011; Rufino, 2012; Shimbo, 2010), além de suas implicações territoriais (Rufino, 2017; Sanfelici, 2013).

O uso quase generalizado do termo provocou reações na literatura, com o argumento de ser necessário “abrir a caixa-preta das finanças” (Christophers, 2015b, 2015a). Em linhas gerais, as principais críticas reivindicavam maior especificidade na descrição do fenômeno, apontando que, para além da compreensão das consequências desse processo, seria necessário aprofundar os conhecimentos em relação ao que seria de fato essa financeirização e como ela se constitui, buscando entender sua materialidade e seus imbricamentos no cotidiano (Christophers, 2015b; Klink e Souza, 2017).

Nesse contexto, ganharam espaço pesquisas associadas à sociologia construtivista, que partem de uma abordagem social do valor, entendido enquanto uma construção inequivocamente flexível (Weber, 2021). Essa literatura tem se dedicado a compreender os instrumentos e mecanismos utilizados pela engenharia financeira, que se apoia na ideia de que o dinheiro admite um valor no tempo (em inglês Time Value Money, ou TVM), na qual essas práticas “calculativas” que projetam o futuro se traduzem em transformações materiais, produzindo o próprio futuro e sendo, portanto, performativas.

A noção de TVM na produção do espaço não é nova e, de alguma maneira, sempre esteve presente na produção capitalista de habitações em decorrência de seu longo tempo de produção (Jaramillo, 1982; Topalov, 1974)1. Na atualidade, no entanto, os cálculos financeiros têm exacerbado essa racionalidade, definindo cada vez mais a forma e a concepção dos empreendimentos projetados, o que impacta diretamente a produção das cidades.

Utilizando o termo valor, os estudos pautados na ideia de performatividade acabam por confrontar um conceito fundamental dos estudos da crítica da economia política, sendo este o aspecto que pretendo aqui explorar, por meio de um ensaio que se propõe a iniciar uma investigação teórica. Nesse sentido, o objetivo do texto é analisar trabalhos que mobilizem a noção de performatividade, refletindo sobre eles sob o ponto de vista da economia política, buscando compreender o papel da engenharia financeira na teoria do valor e em seus imbricamentos com a relação entre valor e preço. A hipótese aqui trabalhada é a de que, ao compreender essa engenharia financeira, suas métricas e práticas como atividades que, em vez de criarem valor, impulsionam a elevação dos preços imobiliários, e tal engenharia financeira acaba por possibilitar maiores capturas de valor global produzido pela sociedade, apropriado por meio de rendas financeiras e imobiliárias.

Além da presente introdução, este trabalho está estruturado em três seções e considerações finais. Na primeira parte, discorro sobre a noção de TVM, sua origem, significado e utilização. No segundo momento, avalio como o TVM tem sido mobilizado por alguns autores no campo dos estudos urbanos, suas aproximações e divergências. Já a terceira parte é dedicada a levantar alguns aspectos e desdobramentos advindos dessa literatura, à luz das reflexões estruturadas pelos estudos críticos da economia política, tecendo, ao fim, algumas considerações.

Uma breve recuperação da noção de <italic>Time Value Money</italic> (TVM)

No setor financeiro, para a tomada de decisão dos investimentos, é de praxe avaliar os riscos e potencialidades de determinado negócio antes de decidir a seu respeito. Essa avaliação é reconhecida no campo econômico como “custo de oportunidade”, conceito que procura representar, dentre os custos associados a cada escolha, a que se apresenta como melhor alternativa (A. Pereira, 1990). Partindo do pressuposto que os recursos disponíveis mundialmente são sempre limitados, ao investir em determinado projeto perdem-se outras oportunidades, sendo imprescindível ao investidor escolher o investimento com retorno mais satisfatório (A. Pereira, 1990).

No caso do setor da construção civil não é diferente, e usualmente os agentes envolvidos na produção imobiliária lançam mão de técnicas fortemente mobilizadas pelo setor financeiro para auxiliar na tomada de decisão sobre investimentos (Lima Jr., 2015). O fato de esse mercado admitir longos períodos para o retorno do investimento – por exemplo, a atividade de incorporação imobiliária, na qual um ciclo de incorporação tradicional de um empreendimento residencial oscila em torno de 3 a 4 anos, considerando desde a compra do terreno até a entrega das habitações – e demandar valores iniciais significativos para dar início à produção das unidades residenciais acaba por aproximar o setor das práticas e técnicas financeiras.

Assim, para a avaliação de investimentos, as finanças lançam mão de técnicas fundamentadas na noção de TVM que, apesar de crescentemente mobilizada nos últimos anos por estudiosos da produção do espaço, não é tão nova assim. Dulman (1989), por exemplo, identificou na virada do século XIX para o século XX a adoção de práticas semelhantes por engenheiros que trabalhavam nos Estados Unidos em indústrias de capital intensivo, primeiro em ferrovias, posteriormente no setor de telecomunicações e mais tarde na indústria petroquímica. Para o autor, até então os investimentos de longa duração eram vistos como despesas operacionais, mas a virada do século marcou o início da utilização de técnicas que procuravam encarar esses grandes investimentos de longa duração como investimentos de capital que auferiam retornos satisfatórios.

A noção de TVM pode ser definida como um princípio financeiro básico, orientado pelo fato de que uma unidade monetária hoje vale mais do que uma unidade monetária no futuro. Essa lógica diferencia os valores de uma unidade monetária no tempo, buscando atualizar todos os valores para um determinado momento comum, colocando-os em pé de igualdade temporal a fim de possibilitar a comparação (Bertolo, 2013). De acordo com Bertolo (2013), há três razões principais que legitimam a noção de TVM. A primeira se refere ao fato de que, com dinheiro na mão hoje, é possível investir e obter um valor maior amanhã em decorrência dos juros recebidos sobre esse dinheiro. Em segundo lugar, deve-se considerar também a ocorrência da inflação, que pode alterar o valor de compra do dinheiro após determinado período. E, de acordo com a terceira razão, deve-se considerar que a receita futura é sempre incerta, ou seja, trata-se de uma previsão que pode ou não vir a se realizar.

Desse modo, as técnicas utilizadas possibilitam trazer todos os gastos e receitas futuras para o momento presente, a fim de se avaliar a viabilidade do investimento. Segundo Balarine (2004), dentre as principais técnicas utilizadas para a análise de projetos pautadas na metodologia do Fluxo de Caixa Descontados (FCD, ou também Discounted Cash Flow – DCF) – que considera o TVM como princípio fundamental –, temos o método do Valor Presente Líquido (VPL) e o método da Taxa Interna de Retorno (TIR)2.

Para este trabalho, não tenho o interesse de detalhar cada uma dessas ferramentas, mas analisar o princípio geral que as rege. Desse modo, à luz do trabalho de Balarine (2004), apresento aqui apenas uma sucinta definição de cada uma dessas técnicas. A primeira delas, o Valor Presente Líquido (VPL) refere-se ao valor líquido obtido por um investimento em potencial após um determinado período de tempo, considerando o custo de capital da empresa como taxa de desconto. Já a Taxa Interna de Retorno (TIR) possibilita comparar diferentes investimentos com base em seus rendimentos anuais.

Embora alguns estudos venham apontando que as ferramentas de cálculo financeiro estão presentes desde a origem da incorporação imobiliária, como mostram Bardet et al. (2020) para o caso francés,3 essas técnicas vêm ganhando cada vez mais espaço na elaboração dos projetos, invertendo sua própria lógica de estruturação. Se antes essas práticas financeiras eram mobilizadas em uma perspectiva mais atrelada ao financiamento da produção imobiliária, na atualidade elas podem ter passado a conceber o empreendimento e a própria atividade da incorporação imobiliária – hipótese essa ainda a ser verificada.

O <italic>Time Value Money</italic> (TVM) e os estudos urbanos

Nos estudos urbanos, é crescente a atenção dada ao TVM (Ashton et al., 2012; Christophers, 2014; Crosby e Henneberry, 2016; Pryke e Allen, 2019; Shimbo et al., 2020; Shimbo et al., 2022; Weber, 2021). No geral, os estudos vêm se aproximando dessa noção, e como ela tem sido mobilizada, tanto por agentes públicos quanto privados, sejam eles incorporadores ou consultores. Em sua grande maioria, esses autores se alinham aos estudos construtivistas e/ou da sociologia da quantificação, que tratam essas práticas “calculativas” como uma construção social, altamente criativa, que constrói valores de modo ativo, e considera que “os valores das propriedades não têm amarração intrínseca, fixa ou essencial” (Weber, 2021, p. 8 , tradução minha).

Na sequência, discuto alguns textos que abordam a TVM direta ou indiretamente, a partir de suas técnicas e instrumentos, a fim de debater como essas influenciam a produção do espaço urbano. De modo geral, parte dos estudos se concentra nas ferramentas de cálculo mobilizadas por agentes da produção do espaço, buscando compreender sua racionalidade, as redes de atores envolvidos e seus significados (Crosby e Henneberry, 2016; McAllister, 2017; Robin, 2018). Outra parte, além de discutir o funcionamento dos instrumentos, trava também um diálogo com a economia política, sinalizando a importância de compreender o contexto geral de adoção dessas técnicas, que não pode ser visto de forma desvinculada (Christophers, 2014; Weber, 2021). Em virtude da generalização dessa racionalidade na estruturação de Parcerias Público-Privadas (PPP), muitos estudos vêm trabalhando esses aspectos para o caso da produção de infraestruturas (Ashton et al., 2012; Pryke e Allen, 2019), mas nesse artigo priorizamos os textos que investigam especialmente o setor de incorporação imobiliária, seja residencial ou comercial.

Na atualidade, Christophers (2014) tem discutido essas práticas “calculativas” através da teoria da performatividade econômica, articulando-a a esfera urbana, demonstrando tanto o poder analítico dos conceitos centrais dessa corrente teórica quanto a necessidade de levar a sério a performatividade da economia na teorização da transformação político-econômica urbana. Segundo o autor, é necessário reconhecer o papel ativo e significativo da economia em produzir e reproduzir o urbano.

Partindo da ascensão na adoção de modelos econômicos fundamentados na concepção do TVM para avaliar a viabilidade econômica da oferta de moradias populares em novos empreendimentos residenciais no Reino Unido desde os anos 2000, Christophers (2014) discute como a produção urbana se assemelha cada vez mais aos parâmetros e pressupostos contidos nesses modelos de viabilidade.

Não obstante, o autor não faz uma defesa cega da performatividade econômica, como teoria única que dê conta de explicar a produção do espaço urbano. Para ele, esses modelos devem ser estudados e interpretados em seu contexto, firmando-se como “parte de um processo político-econômico e ideológico muito mais amplo de incorporação das relações de mercado capitalistas sob o neoliberalismo” (Christophers, 2014, p. 81 , tradução minha). No entanto, o autor é categórico ao dizer que “os modelos que investigo aqui estão cada vez mais organizando o mundo em seus próprios termos, reforçando assim ativamente aqueles desenvolvimentos político-econômicos aos quais eles inicialmente – apenas – deram substância” (Christophers, 2014, p. 81).

A pesquisadora Rachel Weber (Weber, 2021) também vem debatendo o uso de instrumentos e técnicas financeiras associadas ao TVM. Analisando os ciclos de desenvolvimento de escritórios no centro de Chicago, a autora afirma que esses “ciclos de propriedade” são “representações abstratas das atividades de mercado que também influenciam o comportamento dos atores econômicos” (Weber, 2016, p. 600 , tradução minha). Nesse sentido, Weber (2016) indica caminhos para explorar como as ações individuais e as técnicas de cálculo se vinculam a esses “ciclos de propriedade”.

Mais recentemente, Weber (2021) toma como estudo de caso as técnicas de TVM utilizadas em uma política urbana específica adotada em diversos municípios dos Estados Unidos, a Tax Increment Financing (TIF)4. Sua hipótese é que, ao trabalhar com e por meio de dispositivos calculativos emprestados do setor financeiro, o Estado incorpora modos financeirizados de futuridade que procuram alavancar recursos tributários, dentro de uma óptica do planejamento urbano empresarial. Além do mais, ainda segundo a autora, a utilização dessas técnicas possibilita aos planejadores que capitalizem os diferenciais de renda (rent gap) esperados com as mudanças de uso da propriedade, intensificando a produção e a elevação do preço dos imóveis, acentuando as desigualdades urbanas.

Observando as interações entre Estado e setor privado, Weber (2021) evidencia como esses agentes constroem conjuntamente valores imobiliários. Ao adotar previsões mais positivas dos valores futuros, traduzidas na adoção de taxas de desconto menores – com as quais se beneficiam tanto o Estado quanto o setor privado com maiores subsídios –, ambos os agentes retroalimentam uma lógica de valorização dos ativos imobiliários, de certa maneira, coconstruindo e cocondicionando o futuro.

Assim como Christophers (2014), além da microanálise focada nas técnicas de cálculo realizadas, a autora não desconsidera a importância de dinâmicas mais estruturais às quais essas atividades estão submetidas. Em seu texto, destaca as tendências macroeconômicas, assim como a governança urbana financeirizada. Em relação à primeira, Weber (2021) evidencia a relevância da política monetária, pois o custo de capital é geralmente inferido a partir dos custos de empréstimos realizados pelo governo – estipulados por meio das taxas de juros dos títulos do Tesouro Nacional –, bem como a adoção de políticas anti-inflacionárias, pois ambas pressionam para baixo as taxas de desconto. Quanto à segunda, a autora ressalta que a governança financeirizada no nível local, impulsionada pelo movimento de empreendedorismo urbano conforme nomeou Harvey (1989), cria incentivos que estimulam as agências municipais a adotarem as taxas de desconto de seus parceiros privados em vez de aplicar taxas de desconto separadas e mais altas. Em suas palavras, “A virada para as finanças aumentou o interesse e a dependência dos valores futuros dos ativos e dos dispositivos de mercado que poderiam empurrá-los para cima” (Weber, 2021, p. 19 , tradução minha).

Dentre os trabalhos que analisam diretamente o funcionamento dos instrumentos de cálculo a partir de sua lógica interna, suas características, operacionalização, agentes envolvidos, resultados e significados, Crosby e Henneberry (2016) observaram as práticas de cálculo de avaliação de propriedades comerciais no Reino Unido a fim de explorar o papel de ferramentas financeiras específicas nos processos de tomada de decisão. Segundo eles, a maneira como as avaliações são realizadas interfere nos seus resultados e, consequentemente, no mercado imobiliário como um todo. Ademais, mudanças nas práticas de cálculo podem levar a mudanças nas próprias características dos empreendimentos imobiliários, qualificados como ativos, pois estes devem ser qualificados e quantificados de modo a torná-los calculáveis nos moldes exigidos (Crosby e Henneberry, 2016).

Através da construção de uma historiografia da avaliação de investimentos imobiliários desde 1960, os autores mostram como as abordagens tradicionais de avaliação –enraizadas na matemática financeira, com uso implícito de técnicas embasadas no DCF– têm sido cada vez mais desafiadas por aquelas derivadas da economia financeira –caracterizada pelo uso explícito de técnicas de DCF–, ainda que as primeiras se mantenham como as mais utilizadas.5

Os autores defendem que a comparação, técnica tradicional fundamentada em um processo de centralização e padronização de informações, oferece uma explicação para algumas mudanças no ambiente construído que são atribuídas à financeirização, porém essa técnica antecede as próprias transformações do mundo, as quais a bibliografia vem classificando como financeirização. Nesse sentido, os pesquisadores reivindicam a necessidade de interpretações mais detalhadas do processo de financeirização, buscando entender quais as transformações reais que esse fenômeno implica para a produção do espaço urbano. Crosby e Henneberry (2016) argumentam ser fundamental analisar os instrumentos e práticas de cálculos, avançando em uma compreensão refinada e historicamente informada da evolução das práticas de cálculo.

Também analisando o caso da Inglaterra, e considerando as questões operacionais que surgiram na aplicação de cálculos de viabilidade no sistema de planejamento inglês, McAllister (2017) avalia se a adoção de cálculos de viabilidade é adequada ao processo de gerenciamento do desenvolvimento urbano realizado pelo planejamento municipal. Para o autor, interessam menos os resultados da política e mais o processo a partir do qual essa política se desenvolve.

Seu argumento é que devido à incerteza intrínseca dos cálculos de viabilidade (tanto na entrada quanto na saída), que influenciam consideravelmente o potencial de captura de valor da terra. Os cálculos de viabilidade possibilitam uma disputa em torno desses números/valores que induzem comportamentos oportunistas, favorecendo determinados grupos sociais em virtude de assimetrias de poder. Desse modo, há uma disputa política em que incorporadores e proprietários de terras conseguem se colocar de modo mais favorável, por influência ou por maiores recursos, delegando a segundo plano as demandas da comunidade em geral. Diante de tais incertezas, esses agentes tendem a demonstrar que são incapazes de cumprir as políticas de obrigações de planejamento6, ferramenta através da qual os entes municipais procuram recuperar parte dos valores de elevação do preço da terra impulsionados pelos investimentos.

Por fim, Robin (2018) discute o papel central que os incorporadores imobiliários admitem na articulação e delimitação de um conhecimento urbano –ou uma expertise urbana– legítimo, que fundamenta as tomadas de decisão de investimentos em projetos de regeneração de grande porte. Sua análise empírica é referendada em um grande projeto de regeneração urbana edificado na cidade de Londres, o chamado King’s Cross Central.

Para a autora, os incorporadores atuam no sentido de remodelar os parâmetros dentro dos quais o conhecimento urbano é produzido e utilizado, influenciando a maneira como as cidades são planejadas e construídas. Robin (2018) afirma que se trata de uma estratégia política, na qual a mobilização de um vasto e diversificado sistema de especialistas que produzem grandes relatórios técnicos possibilita a mitigação da oposição política diante dos projetos, além de sustentar um predomínio de métricas quantitativas e projeções financeiras na decisão do negócio, que atendem diretamente seus interesses. Seu argumento é que a mobilização desse conhecimento sobre as técnicas de cálculo contribuem para legitimar o desenho de instrumentos de planejamento (design institucional e urbano) que difundem e realizam valores imobiliários.

Em geral, esses diversos estudos se aproximam de abordagens construtivistas que consideram o valor uma noção socialmente construída, que reflete uma pluralidade de expectativas ficcionais que circulam no mercado, sendo a todo o momento debatidas, questionadas e reinterpretadas. A partir dessa perspectiva, as práticas e instrumentos mobilizados na quantificação atribuem de modo ativo valores, fato esse que leva à emergência do argumento da performatividade das técnicas e instrumentos. O princípio dessa noção é elucidar as relações entre conhecimento abstrato e material, através de práticas reais. Segundo Klink e Souza (2017, p. 388), a performatividade ganhou destaque com os trabalhos de Mackenzie e Callon, que argumentaram que “os modelos econômicos utilizados no mercado financeiro não apenas descrevem a realidade da bolsa, mas transformam as práticas utilizadas pelos operadores na praça financeira e, com isso, o próprio mercado”.

Considerando as aproximações e divergências entre os textos, vale mencionar a pluralidade de agentes que vem mobilizando as técnicas TVM. Além da adoção dessas técnicas pelo setor privado (Christophers, 2014; Crosby e Henneberry, 2016; Robin, 2018), os agentes públicos têm incorporado cada vez mais essas lógicas em suas atividades, com poder limitado de ações nesse sentido (McAllister, 2017; Weber, 2021). Longe de se apresentarem como técnicas neutras, há uma dimensão ideológica forte em sua adoção e uma disputa política em sua operacionalização, consideravelmente afetada pela assimetria de poder dos distintos agentes envueltos (McAllister, 2017; Robin, 2018; Weber, 2021). Não obstante, a bibliografia analisada pouco se concentra na dimensão produtiva da produção do espaço, em seu nível imediato.7

Outro ponto suscitado é justamente a articulação específica entre esses métodos de cálculo que levam em consideração o TVM e o chamado processo de financeirização. A pesquisa de Crosby e Henneberry (2016) demonstrou que modelos utilizados anteriormente já utilizavam técnicas que incorporavam, mesmo que de modo implícito, noções como o DCF, indicando que esse entrelaçamento é anterior ao chamado processo de financeirização. Como consequência, cabe se perguntar em que medida a noção de performatividade dialoga ou não com o conceito de financeirização, ressaltando a importância de clarear esses vínculos.

Desdobramentos possíveis a partir da bibliografia: reflexões à luz da crítica da economia política

De partida, é necessário fazer uma observação quanto à terminologia das palavras utilizadas nos textos discutidos e como elas podem ser interpretadas pela crítica da economia política. A pedra angular nessa reflexão é justamente a noção de valor, cujo significado admite acepções muito distintas a depender do instrumental teórico mobilizado. Neste trabalho, não pretendo realizar uma revisão pormenorizada sobre o debate da categoria valor nem de suas controvérsias, sob as quais muita tinta já foi gasta.8 Para este argumento, vou me ater às definições elementares, tanto dos estudos construtivistas quanto, e em especial, da crítica à economia política.

Como vimos, nos estudos vinculados à sociologia construtivista, o valor é entendido como uma construção social, e sua mensuração, por consequência, envolve uma série de estratégias e práticas, tanto materiais quanto discursivas, nas quais se inserem também as atividades “calculistas”. Por essa definição, trata-se de um valor de grandeza intrinsecamente flexível e constantemente reavaliada, que não apresenta uma “essência” prévia, anterior. Tal definição, não obstante, difere substancialmente das duas tendências identificadas por Orléan (2014) ao retomar as substâncias do valor mobilizadas pelos economistas, a saber: o trabalho e a utilidade. Porém, como bem indaga Pereira (2017, p. 186): “seria o valor uma substância?”.

Nos estudos marxistas, o valor é compreendido como uma relação social, ou seja, uma relação entre pessoas que produzem mercadorias dentro do modo capitalista de produção. Nesse sentido, o valor não pode ser considerado uma qualidade física ou natural da mercadoria. Trata-se de uma qualidade social que se efetiva apenas pela troca de mercadorias e que se relaciona com a riqueza mercantil produzida pelo trabalho social, por toda a sociedade. O valor enquanto uma propriedade, que se configura como uma característica intrínseca de cada mercadoria, só poder ser assim compreendido em um primeiro momento, e apenas em um primeiro momento, tal qual todas as categorias da dialética materialista, que sempre se transformam ao longo do tempo (Carcanholo, 2005).9 É apenas nessa primeira análise que o valor e sua grandeza podem ser compreendidos – e não definidos – enquanto “quantidade de trabalho socialmente necessária ou o tempo de trabalho socialmente necessário para a produção de um valor de uso” (Marx, 2013, p. 117), entendendo esse trabalho socialmente necessário como o trabalho humano em geral, abstrato, e não uma forma particular.10

Para Marx:

a objetividade do valor não é algo natural, nem a-histórico. […] a objetividade do valor é fato social próprio das relações capitalistas de produção sendo reposto na circulação, por meio de relações de troca que estruturam a emergência do valor como trabalho abstrato” (P. C. X. Pereira, 2017, p. 181).

Desse modo, o valor na teoria marxista não pode ser compreendido como uma categoria de natureza econômica, definível, estática e quantificável. Trata-se de uma “propriedade social das mercadorias que consiste em um certo poder de compra, de magnitude só aproximadamente determinada”, apresentando-se como uma qualidade das mercadorias, atribuída de modo objetivo e socialmente a elas, e somente durante um determinado período de tempo, uma época (Carcanholo, 2005, pp. 7–8).

Sem embargo, essa noção de valor não nos interessa aqui em sua individualidade, mas, sim, em sua relação dialética com a noção de preços, conforme adverte Pereira (2017). Tal como adota o autor, partimos do pressuposto de que “os preços nada mais são que uma manifestação monetária do valor da mercadoria” (P. C. X. Pereira, 2017, p. 171), sempre lembrando que o valor não equivale ao preço, mas se manifesta por meio deste.

Com base nessa definição, há duas interpretações possíveis para os estudos de performatividade sob a óptica marxista da teoria do valor. A primeira sugere que, articulando a economia política e a performatividade, seria possível dizer que esses métodos criam, de fato, valor, nos termos da teoria marxista. Para argumentar nesse sentido, o próprio Christophers (2014) relembra que Marx falara, em algum momento, sobre o papel produtivo da contabilidade no capitalismo. No entanto, ainda que o autor argumente que a contabilidade possa ser considerada um trabalho produtivo – o que em minha perspectiva não procede –, essa agregaria valor por meio da incorporação de trabalho abstrato, na construção imediata da mercadoria imobiliária, fato este que, ainda assim, não consegue explicar a racionalidade por trás das substanciais elevações de preço do produto imobiliário, além de não conseguir explicar como esse valor se relaciona também com a terra, elemento que particulariza o setor.

A defesa de que o próprio modelo passa a organizar o mundo, em seus próprios termos (Christophers, 2014), parece incorrer exatamente no fetichismo que Marx desvelou logo no primeiro capítulo d'O capital. Segundo Marx, o fetichismo consiste em demonstrar que, na sociedade capitalista, as mercadorias parecem independentes das práxis humanas que as criam, ocultando o trabalho que as produz. A relação de valor existente entre as mercadorias aparenta uma relação entre coisas, que na realidade obscurece uma relação real entre os próprios homens, produtores de mercadorias (Marx, 2013).

O argumento de que as técnicas e práticas financeiras poderiam criar valor, desse modo, obscurece a determinação central do valor, que reside no trabalho abstrato (e não no trabalho diretamente incorporado), e que no caso específico da incorporação imobiliária se efetiva com a venda dos imóveis. Em sua obra, Marx argumenta que é importante se distanciar do fetiche a fim de compreender as relações que regem o mercado, ou seja, as relações entre os seres humanos que o produzem. O fetichismo da mercadoria nada mais é do que a situação social em que a relação entre os produtores se exterioriza, na aparência de uma relação entre mercadorias, escondendo todo o trabalho realizado. Trata-se de uma relação que se disfarça, que se apresenta como outra.

Nos estudos urbanos, o enfrentamento do fetichismo se reforça, pois a produção do espaço tem, por definição, um elemento indissociável – a terra. Ainda que essa não seja produto do trabalho, admite “um valor de uso que privatizado e comercializado tem preço. Por isso, expressa valor de mercado, mas, por não ser um resultado do trabalho, não contém tal substância, o seu ‘valor’ é apenas uma expressão do preço” (P. C. X. Pereira, 2017, p. 186). Cumpre pontuar aqui que esse fetiche no valor dos produtos imobiliários não provém da terra como elemento natural. Ele advém da forma que a propriedade da terra admite nas relações de produção e apropriação do espaço (Rubin, 1987 citado em P. C. X. Pereira, 2017).

Para apreender isso de forma mais clara, é preciso recapitular como se dá a formação dos preços das mercadorias em geral e no mercado imobiliário em particular. Essa recuperação auxiliará na discussão da segunda interpretação possível acerca dos estudos da performatividade, quando confrontados com a crítica da economia política. Tal interpretação consiste no fato de que essa “criação de valor” supostamente impulsionada pela engenharia financeira, através de instrumentos e práticas financeiras, corresponderia, na verdade, a um aumento de preços das mercadorias imobiliárias, e não exatamente de valor nos termos da economia política. Dentro dessa perspectiva, argumento que essa elevação nos preços imobiliários possibilita uma captura de valor da mais-valia globalmente produzida, por toda a sociedade, que é intermediada pela sofisticação das formas de propriedade –sejam elas mobiliárias ou imobiliárias–.

Via de regra, o valor das mercadorias está associado tanto ao seu preço de produção, que considera os custos em sua produção, acrescido de uma taxa média de lucro, quanto ao preço ao qual essas mercadorias são vendidas no mercado –preço que incorpora oscilações de oferta e demanda–, não podendo ser confundido diretamente com nenhum dos dois. Ademais, é importante considerar que o preço de produção não tende a permanecer muito tempo acima do valor da mercadoria, pois essa diferença acaba estimulando um aumento de sua produção e, consequentemente, uma redução nos preços, que tende a reequilibrar essa equação por meio das regras da concorrência.11 É através desse mecanismo que o valor inclina-se a regular a produção e circulação das mercadorias através da formação do preço de produção, que é estabelecido “no remoinho dos preços das mercadorias no mercado”, sendo este movimento dos preços “coordenado pelo deslocamento do capital e do trabalho na produção social, movimento este que conduz a equalização do valor das mercadorias” (P. C. X. Pereira, 1988, p. 9).12

No processo de reprodução do capital por meio da produção imobiliária, “a concorrência capitalista não regula o preço de mercado do imóvel pelo preço de produção da construção (do edifício produzido), mas pelo que objetivamente interessa ao capital, o montante do valor excedente da mercadoria, a mais-valia” (P. C. X. Pereira, 2017, p. 194). Conforme apresentado, na sociedade atual, a terra se apresenta como mercadoria que tem preço, a despeito de não ter sido produzida pelo trabalho humano, e, portanto, não ser uma fonte de valor. Desse modo, valor e preço se diferenciam no produto imobiliário, pois esse admite como condição fundamental que seu preço de mercado seja maior que o seu preço de produção e que seu valor, para remunerar, por meio da renda da terra, o proprietário da terra. Em outras palavras, pode-se dizer que ao preço de produção se sobrepõe a renda da terra capitalizada (Lefebvre, 1972; P. C. X. Pereira, 1988).

A essa particularidade da reprodução do capital na produção imobiliária é importante associar os escritos de Marx no Livro III, capítulo 46. Ao discutir a renda de terrenos para a construção e o preço da terra, Marx (Marx, 2017, p. 835) destaca que, em decorrência dessas características anteriormente citadas, o setor, como consequência, acaba por funcionar com base em preços de monopólio, definindo-o como “um preço determinado apenas pela ânsia de comprar e pela solvência dos compradores, independentemente do preço determinado pelo preço geral de produção, bem como pelo valor dos produtos”. Sem desviar-se da lei do valor como reguladora da produção, mas acirrando a contradição entre valor e preço, “a atividade imobiliária abre-se para a possibilidade de produzir excedentes cada vez maiores. Isto porque a formação dos excedentes fica acoplada aos preços monopolistas no mercado, e a capitalização da renda independe do preço de produção” (P. C. X. Pereira, 2017, p. 197).

Enfim, chega-se então à questão da renda na mercadoria imobiliária e como ela se articula ao processo de produção e distribuição do valor, resolvendo certas (in)equivalências, expressas no preço da terra. É importante lembrar que a renda é parte constitutiva da mais-valia, assim como o juro e o lucro, podendo esta ser fração da mais-valia da própria mercadoria ou fração da mais-valia de outras mercadorias. Ademais, cabe mencionar que a renda é, em essência, o direito de um proprietário a receber um pagamento pelo uso da terra. Trata-se de uma relação social, que, de acordo com Marx, advém da sociedade (através de um título de propriedade), e não do solo. Nesse sentido, a renda nada mais é do que uma captura de parte da mais-valia global produzida na economia capitalista. E essa captura pode se dar tanto em termos intrassetoriais, no próprio âmbito da produção do espaço, caracterizado por uma multiplicidade de formas de produção (Borges, 2019; Jaramillo, 1982), como entre os distintos setores industriais, através da equalização da taxa de lucro.

No caso da produção do espaço, a renda da terra é fundamental para pensar as relações entre preço e valor no produto imobiliário, e sua formação se particulariza por apresentar em uma mesma mercadoria um duplo-monopólio: o monopólio da natureza (do qual advêm as rendas extrativas e fundiárias) e o monopólio do espaço (compreendido como base territorial, necessária a toda e qualquer atividade humana, e que paga seu tributo por meio da renda imobiliária).13 Dito de outro modo, a renda na atividade de construção admite um caráter específico por combinar o monopólio da produção, que se baseia em uma remuneração fundamentada na exploração do trabalho e na extração/transformação de materiais (valorização) e o monopólio da propriedade, que possibilita a extração de rendas em virtude de um título jurídico (capitalização) (P. C. X. Pereira e Petrella, 2018).

Considerando as duas circunstâncias descritas por Marx (2017, p. 835), “se a renda deriva de um preço monopólico por existir um preço monopólico dos produtos ou do próprio solo dela independente ou se os produtos são vendidos por um preço monopólico pelo fato de existir uma renda”, Pereira (2017, p. 202) argumenta que o monopólio da propriedade da terra acaba por incidir na elevação da renda da terra “ao conformar um mecanismo de distribuição da mais-valia que eleva, mutuamente, a renda e o preço de monopólio”.

A tudo isso, na atualidade, somam-se as transformações estruturais do capitalismo sob dominância financeira, nas quais a acumulação capitalista passa a se centrar no capital portador de juros e nas mercadorias fictícias (Chesnais, 2015). Por meio de ativos financeiros lastreados na capitalização de um fluxo de rendas futuras, sem contrapartida no capital industrial efetivo, o capital fictício desponta, ampliando as possibilidades de extração de renda.14

Conforme destaca Pereira (2017), de um lado há as afirmações de Chesnais (2015) sobre uma nova fase da acumulação capitalista, liderada pelo capital financeiro. Por outro, é necessário considerar a contribuição de Lefebvre (1999), que afirma que o capitalismo ganhou uma sobrevida ao se expandir para a produção do espaço, produzindo e reproduzindo as relações sociais de produção capitalistas. Sem embargo, a despeito das divergências de ênfase de ambos os autores, os dois sinalizam mudanças na lei do valor, ampliando o afastamento entre preços e valores (P. C. X. Pereira, 2017). Em minha perspectiva, argumento aqui que seria nesse distanciamento que a engenharia financeira incidiria, ampliando ainda mais os preços, possibilitando maior apropriação de valor (criado na produção de outras mercadorias) na forma de renda.

Por fim, um último apontamento que busca articular os estudos focados nas métricas e práticas mobilizadas pela engenharia financeira e as reflexões da crítica da economia política centram-se justamente na capacidade da engenharia financeira em acelerar e acentuar o processo de capitalização, trazendo para o presente a previsão de criação de valores futuros. Tal capacidade possibilita uma aceleração do tempo de rotação do capital na produção do espaço, fato este que, sob o ponto de vista da economia política, é fundamental. Estudando o capital fictício, Días Carcanholo (2017) sugere que ao promover essa aceleração, exigindo tal antecipação dos ganhos futuros, o capital fictício interfere indiretamente na produção, sendo necessário avançarmos em suas implicações no estágio atual da acumulação capitalista.

Considerações finais

A revisão bibliográfica aqui apresentada foi relevante no entendimento da mobilização que tem sido feita das noções de valor e performatividade a fim de compreender a produção do espaço urbano contemporâneo. Muitos desses trabalhos advêm de concepções da sociologia construtivista que concebe o valor como uma construção social intrinsecamente flexível, que converge a todo momento a uma pluralidade de expectativas convencionadas. Além do mais, pelo fato de antecipar o futuro, acaba por incidir sobre ele, atribuindo valores ou, em outros termos, performando. Ao buscar traduzir essa amplitude de expectativas e conhecimentos abstratos, essas práticas assumem uma dimensão material, que, segundo esses autores, se expressa na produção do ambiente construído.

De maneira geral, essa bibliografia pode ser dividida em dois grandes grupos. O primeiro se atém aos instrumentos e métodos de cálculo baseados no TVM e como estes são utilizados por distintos agentes envolvidos na produção do espaço urbano, desde poderes públicos locais na figura dos planejadores urbanos, passando pelos incorporadores e chegando também nas consultorias imobiliárias, que, via de regra, realizam avaliações acerca de empreendimentos presentes e futuros. Esses estudos buscam compreender tais instrumentos a partir de sua lógica interna, suas dinâmicas e consequências. E o segundo grupo, que, além de buscar compreender os instrumentos e práticas “calculativas”, leva em consideração também as dinâmicas mais gerais, tanto econômica quanto política, ressaltando que a produção do espaço urbano não pode ser compreendida fora de seu contexto mais amplo.

Ademais, foi possível avançar na compreensão dessas contribuições sob a óptica da crítica da economia política, buscando apreender as dinâmicas desveladas sem se desprender da teoria do valor. A análise aqui realizada indicou que, por esse ângulo, os estudos de performatividade podem ser interpretados de duas maneiras.

A primeira delas seria a de que essas técnicas e práticas financeiras poderiam de fato produzir valor, perspectiva esta que parece esquecer o conteúdo essencial do valor, reconhecido nos estudos marxistas como tempo de trabalho socialmente necessário (trabalho abstrato), incorrendo em um entendimento fetichizado que desconsidera que as aparentes relações entre coisas nada mais são do que relações entre pessoas.

A segunda possibilidade seria interpretar essas práticas da engenharia financeira como atividades que, ao atribuir valores às mercadorias através de métricas financeiras que adicionam aos cálculos produtivos tradicionais os cálculos de rentabilidade futura, possibilitam uma ampliação do preço das mercadorias imobiliárias e, por consequência, viabilizam maiores capturas de valor global produzido pela sociedade, apropriados por meio de rendas (financeiras e imobiliárias), que tem na mercadoria imobiliária um impulso particular em virtude de seu imbricamento com a terra. O descolamento entre preços e valores, que se acentuou com as transformações mundiais ocorridas no capitalismo nos anos 1970, seja por meio das finanças (Chesnais, 2015), seja do espaço (Lefebvre, 1999), ampliam ainda mais as possibilidades de apropriação de rendas aos possibilitar a elevação dos preços da mercadoria imobiliária, em um movimento que se retroalimenta.

O espaço mobilizado como riqueza imobiliária e financeira passa continuamente a valer mais (os preços no mercado de terra e no de dinheiro se realimentam incessantemente). Essa combinação cria liquidez e manipula a raridade do espaço, favorecendo a produção do espaço e do valor a tal ponto que ela alcança o nível da economia mundial. A propriedade da terra e a propriedade do dinheiro se ativam mutuamente na mobilização do espaço pelo capital (P. C. X. Pereira, 2017, p. 187).

Nesse sentido, essas reflexões apontam caminhos para avançar no aprofundamento da teoria do valor por meio da produção do espaço, buscando identificar e complementar as lacunas ainda em aberto. A tarefa que nos está posta é justamente compreender esses movimentos dos preços e valores na economia política contemporânea, observando como se colocam na atualidade as relações sociais de produção e reprodução do capital, com destaque para as relações de propriedade.

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O largo tempo de produção não é uma particularidade específica da habitação, mas da produção do espaço em geral, seja a produção de infraestruturas, seja do setor imobiliário, que abarca não somente a produção residencial, mas também comercial e industrial.

Além do VPL e da TIR, o autor apresenta uma terceira técnica, que leva em consideração essas diferentes taxas, intitulada Taxa Interna de Retorno Modificada (MTIR).

Segundo os autores, ainda que o nível médio de gestão das empresas incorpore práticas menos “financeirizadas” do que o nível da alta administração, ambos podem ser qualificados como “financeirizados”, apresentando traços semelhantes desde o início de suas atividades nos anos 1970 (Bardet et al., 2020).

A TIF pode ser compreendida como um instrumento que possibilita aos municípios pagar despesas de reestruturação urbana privadas por meio de receitas fiscais futuras geradas a partir da criação/ transformação de propriedades em um determinado distrito designado. Sua principal vantagem para os desenvolvedores é que esta fornece subsídios a fim de cobrir despesas (como custos com aquisição de terras, financiamento e despesas de construção) que, de outra forma, eles teriam de assumir.

Segundo Crosby e Henneberry (2016), existem duas abordagens principais para a avaliação de investimentos. A primeira é o método de avaliação convencional, no qual há a aplicação de um rendimento ou taxa de capitalização ao fluxo de renda atual, sem que nenhuma suposição explícita seja feita com relação a mudanças de valor futuras. Nesse caso, “o rendimento é derivado da análise de transações semelhantes e incorpora implicitamente as premissas sobre o crescimento futuro do aluguel e o risco” (Crosby e Henneberry, 2016, p. 1428 , tradução minha). A segunda abordagem consiste em estimar o valor presente da receita futura de aluguel, descontando-a a uma taxa apropriada, demandando avaliações de crescimento do retorno, risco e premissas sobre arrendamentos futuros, sendo por isso denominada uma abordagem de DCF explícita.

Instrumento que prevê contrapartidas dadas pelo mercado para a construção de empreendimentos imobiliários. Usualmente as requisições se referem a habitações sociais (não mercantis/acessíveis) e contribuições em educação, saúde, infraestrutura e outras instalações de interesse da comunidade.

Em O capital, Marx (2014) já sinalizava a importância de compreender o processo de produção e reprodução do capital a partir de distintos níveis de análise. Com base nisso, Lefebvre (1999) propõe níveis que, por um lado, possibilitam compreender a simultaneidade de tais processos e, por outro, que dão ênfase a distintos processos de produção e reprodução ampliada, sendo estes níveis identificados como imediato, global e total. Segundo Pereira e Petrella (2018), no nível global, podemos observar as formas predominantes de acumulação capitalista e as condições atuais de (re)produção do capital. Já na dimensão imediata, o que se destaca é justamente as relações de e na produção direta das mercadorias, que, no caso no imobiliário, ressalta sua particularidade por articular a construção do imóvel e a propriedade da terra. Por fim, a reprodução social se coloca no nível do total, que abarca as diversas formas de reconhecimento e experiência, individual ou coletiva, que emergem dos conflitos cotidianos e urbanos.

Parte das interpretações sobre o valor ao longo da história foi revisitada por Mazzucato (2020) em seu livro O valor de tudo: produção e apropriação na economia global. Já Harvey (2015) e Pereira (2017) também retomam essa discussão, apresentando suas controvérsias tanto fora quanto dentro da vertente marxista. Quanto à primeira, podemos mencionar o trabalho de Orléan (2014), O império do valor. Já em uma abordagem marxista, vale salientar os trabalhos do grupo Krisis, que procurou estabelecer uma crítica do valor, em especial nas obras de Robert Kurz e Ernst Lohoff.

Na dialética marxista, as categorias não podem ser entendidas como algo dado, como algo que possa ser definido e que assuma esse significado pela eternidade. Trata-se sempre de categorias em permanente desenvolvimento, constantemente redefinidas (Carcanholo, 2005).

É necessário pontuar que a noção de valor, em Marx, é muito mais complexa do que a definição aqui apresentada. Ao longo d'O capital, o autor vai apresentando e complexificando pouco a pouco essa categoria, e toda a teoria que em torno dela se estrutura. A definição aqui apresentada estabelece apenas um pontapé inicial para sua compreensão.

Cumpre ressaltar que a não identidade contábil entre valor e preços não se dá apenas por esses aspectos conjunturais, a saber, a tendência ao equilíbrio pelas regras da concorrência, mas também por um processo estrutural, denominado por Marx como equalização da taxa de lucro. Tal processo evidencia que a concorrência faz exatamente o contrário, impedindo a convergência entre preços e valores para equalizar as taxas de lucro do capital investido.

Agradeço aqui os comentários preciosos e precisos dos pareceristas anônimos, que possibilitaram maior rigor teórico ao raciocínio e à redação deste texto.

“Aqui, dois elementos entram em consideração: por um lado, a exploração da terra para fins de produção ou extração; por outro, o espaço requerido como elemento de toda produção e de toda ação humana. Em ambos os sentidos, a propriedade da terra exige seu tributo” (Marx, 2017, p. 834).

Segundo Paulani (2009, p. 28), “Marx chama de capital fictício tudo aquilo que não é, nunca foi, nem será capital, mas que funciona como tal. Trata-se, em geral, de títulos de propriedade sobre direitos, direitos de valorização futura no caso das ações, de renda de juros a partir de valorização futura, no caso de títulos de dívida privados, e de recursos oriundos de tributação futura, no caso de títulos públicos. Em todos esses casos, a valorização verdadeira dessa riqueza fictícia depende da efetivação de processos de valorização produtiva e extração de mais-valia; em outras palavras, da contínua produção de excedente e da alocação de parte desse excedente para valorizar o capital fictício”.

Agradeço aos comentários e sugestões das professoras Lúcia Shimbo e Beatriz Rufino, assim como dos dois pareceristas anônimos que apontaram excelentes questões para o aprimoramento das reflexões aqui sugeridas.

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Quid16. Revista del Área de Estudios Urbanos. ISSN: 2250-4060.


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